A situação da saúde no Brasil
Naercio Menezes Filho |
Valor Econômico - 23/04/2010 |
Nos últimos anos, a sociedade brasileira acordou para a importância da educação no Brasil. Isso ocorreu porque as avaliações educacionais produziram novos dados e mostraram para a sociedade que a qualidade da educação é muito ruim. A partir dessa mobilização, novas políticas educacionais estão sendo implementadas e avaliadas por especialistas, o que permitirá que as iniciativas mais bem sucedidas sejam disseminadas. Entretanto, o mesmo não tem ocorrido na área de saúde. Embora tão importante como a educação e em situação igualmente precária em muitos aspectos, a sociedade ainda não parece mobilizada para a questão da saúde no Brasil. Já é hora de revertemos essa situação, especialmente neste ano eleitoral. Em primeiro lugar, é necessário fazer o diagnóstico da situação atual. Diversas pesquisas mostram que os primeiros anos de vida de uma pessoa são fundamentais para o seu desenvolvimento futuro. Em particular, é nos três primeiros anos de vida que a pessoa forma o "hardware" que vai moldar sua capacidade de aprendizado e raciocínio ao longo da vida. Assim, investimentos públicos nessa fase da vida tem retornos muito elevados e devem ser priorizados. Um indicador extremo da qualidade das políticas públicas na área de saúde é a taxa de mortalidade nas diversas faixas etárias. Como tem evoluído a taxa de mortalidade infantil no Brasil? A tabela ao lado mostra a taxa de mortalidade na infância (entre 0 e 5 anos de idade) em 2007 em alguns países selecionados e a sua redução entre 1990 e 2007. Podemos notar, em primeiro lugar, que a taxa de mortalidade no Brasil ainda é muito elevada, atingindo 22 em cada mil crianças nascidas vidas em 2007, a mesma taxa da China e um pouco acima da que prevalece no Peru e na Argentina. Enquanto isso, na Coreia e em Cuba apenas seis crianças morrem antes dos cinco anos de idade em cada mil nascidas vivas, um índice comparável aos países mais desenvolvidos. Entre os países da América do Sul, o Brasil só está à frente da Bolívia e do Paraguai. Esses dados mostram que, assim como na educação, ainda existe muito trabalho a ser feito na área da saúde. Mas, como tem sido a evolução desse indicador no passado recente? Entre 1990 e 2007 o Brasil evitou 36 mortes na infância em cada 1000 nascidos vivos, um desempenho bastante satisfatório. Entre os países sul-americanos, somente Bolívia e Peru obtiveram avanços maiores no mesmo período. Obviamente, quanto maior o nível inicial da mortalidade, mais fácil é conseguir reduzi-la com medidas de acesso a serviços básicos de saúde, nutrição e saneamento. Assim, na Coreia e em Cuba, como a taxa de mortalidade já é bastante reduzida, reduções adicionais são difíceis de serem alcançadas. Mesmo assim, deve-se notar que Cuba, apesar de todos os seus problemas políticos, conseguiu reduzir significativamente a mortalidade na infância nas últimas duas décadas, assim como a China, apesar de sua enorme população. Por outro lado, o Paraguai está numa situação bastante complicada, com altas taxas e pequenas reduções na mortalidade. Quais foram os principais fatores responsáveis por essa redução na mortalidade infantil observada recentemente no Brasil? Pesquisas mostram que esse sucesso foi atingido por uma combinação de fatores, relacionados com políticas públicas na área de saúde, saneamento básico e condições sócio-econômicas das famílias. Em termos de políticas públicas, uma das mais efetivas parece ter sido a criação do Programa Saúde da Família (PSF). Esse programa, instituído em 1994 e expandido desde então, atinge hoje metade da população do país e busca atender as famílias mais pobres com equipes de profissionais da área médica atuando para prevenir e detectar doenças e acompanhar a gestação. Em termos sócio-econômicos, a rápida evolução na escolaridade dos país ocorrida a partir da década de 90 teve impactos significativos no acesso aos serviços de saúde, uma vez que a educação amplia a informação sobre os serviços disponíveis. Apesar dos avanços obtidos na atenção básica, os desafios na área de saúde são enormes. Um dos principais problemas é a baixa qualidade do atendimento que é oferecido nos hospitais e postos de saúde para a maior parte da população. Isso ocorre apesar dos gastos com saúde serem bastante elevados. Em 2007 o Brasil gastou 8,4% do PIB com saúde. Desse total, cerca de 58% foram gastos pelas famílias, enquanto o setor público foi responsável por 42%. Vale notar que a população mais pobre gasta proporcionalmente mais com saúde e medicamentos do que os mais ricos. Um dos principais problemas é que o país tem dois sistemas de saúde, um público (Sistema Único de Saúde) e um privado (sistema de seguro), que não se comunicam adequadamente. As famílias de renda média, por exemplo, tendem a usar o sistema privado de saúde para tratar doenças mais simples e o sistema público quando precisam utilizar serviços de diagnóstico e tratamento complexos. Dessa forma, a sociedade brasileira precisa enfrentar os problemas de financiamento e estruturação do seu sistema de saúde, ao mesmo que tempo em que debate medidas para melhorar a gestão dos recursos que estão sendo aplicados, principalmente na área hospitalar. Como podemos perceber, os desafios na área de saúde são tão ou mais complexos que os da educação. |
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