Comparação incomparável
Dora Kramer
O Estado de S. Paulo - 21/01/2010
O presidente Luiz Inácio da Silva faz o estilo caudilho, quer mandar em tudo e em todos. Ao PT impôs uma candidata que o partido carrega contrariado, mas conformado, refém de duas crises: de identidade e de baixa estima.
Abriu mão de decidir sobre o próprio destino porque não sabe mais quem é nem o que quer a não ser se manter no poder tendo como referência única a popularidade de Lula. A conquista desse capital por meio de um trabalho de construção do mito fez com que o partido transferisse ao chefe todo poder de escolher seus caminhos.
Como se ele fosse o único dono de discernimento, habilidade política e capacidade estratégica entre milhares de petistas.
Em grau menor, os outros aliados ao presidente agem da mesma forma. Não só deixam que Lula interfira em suas decisões, como pedem sua interferência para resolver pendências.
Já houve ocasião em que a assessoria de comunicação do Palácio do Planalto quis dar a impressão de que Lula poderia até influir nas decisões dos oposicionistas. Foi quando divulgou que o presidente daria "um jeito" de convencer o governador de Minas, Aécio Neves, a insistir na candidatura presidencial para "forçar" o governador de São Paulo, José Serra, a optar pela reeleição.
Lula muda o calendário eleitoral, transgride a legislação sem pejo nem contestação, faz candidatos desistirem de concorrer a governos de Estados, determina quem vai disputar o Senado, transforma um político de dimensão nacional como Ciro Gomes em estafeta de suas conveniências, quer mandar na escolha do candidato a vice do PMDB e, no ápice da convicção de ser absoluto, vive a convicção de que pode comandar a vontade do eleitor que o seguiria independentemente da qualidade da candidatura por ele sustentada.
Em resumo, transita como um coronel em seu hábitat, o curral eleitoral.
Feito o longo enunciado da premissa, vamos ao ponto: só esse modo de agir de Lula já seria suficiente para marcar a especificidade do processo eleitoral brasileiro e a impossibilidade de compará-lo a qualquer outro na tentativa de estabelecer paralelos com resultados de eleições já concluídas.
Especificamente a do Chile, onde Sebastián Piñera derrotou o ex-presidente Eduardo Frei, candidato da presidente Michele Bachelet, dona de 81% de aprovação popular.
Como raciocínio hipotético à falta de uma discussão mais consistente, até vale o cotejo. Mas a conclusão de que é "prova" de que voto não se transfere e, portanto, Dilma teria necessariamente o destino de Frei é falha. E rasa.
Não leva em conta as diferenças abissais entre os dois países, seja no histórico, na formação educacional de suas populações, na definição ideológica dos partidos, na identificação entre eles na formação das coalizões, na natureza da popularidade de um e de outro presidente (aqui fruto de um bem montado esquema de culto à personalidade) e, principalmente, no papel dos chefes de ambas as nações no processo eleitoral.
Ao contrário de Lula, Bachelet não carregou um "poste". Uma por questão de estilo e circunstância, outra porque Eduardo Frei tem história no Chile.
Lá, a transferência de votos não foi questão decisiva como será aqui nem a presidente da República galvanizou as atenções tomando ela o lugar do candidato. Tampouco são semelhantes as razões do eleitorado para decidir.
Essas observações não pretendem montar uma equação a respeito de vantagens ou desvantagem comparativas, mas apenas pontuar uma obviedade: impossível comparar situações diferentes e pretender chegar a uma conclusão razoavelmente condizente com a realidade.
O que vai definir o desempenho de Dilma é o grau de empatia que ela conseguir, ou não, estabelecer com o eleitor.
O presidente Luiz Inácio da Silva faz o estilo caudilho, quer mandar em tudo e em todos. Ao PT impôs uma candidata que o partido carrega contrariado, mas conformado, refém de duas crises: de identidade e de baixa estima.
Abriu mão de decidir sobre o próprio destino porque não sabe mais quem é nem o que quer a não ser se manter no poder tendo como referência única a popularidade de Lula. A conquista desse capital por meio de um trabalho de construção do mito fez com que o partido transferisse ao chefe todo poder de escolher seus caminhos.
Como se ele fosse o único dono de discernimento, habilidade política e capacidade estratégica entre milhares de petistas.
Em grau menor, os outros aliados ao presidente agem da mesma forma. Não só deixam que Lula interfira em suas decisões, como pedem sua interferência para resolver pendências.
Já houve ocasião em que a assessoria de comunicação do Palácio do Planalto quis dar a impressão de que Lula poderia até influir nas decisões dos oposicionistas. Foi quando divulgou que o presidente daria "um jeito" de convencer o governador de Minas, Aécio Neves, a insistir na candidatura presidencial para "forçar" o governador de São Paulo, José Serra, a optar pela reeleição.
Lula muda o calendário eleitoral, transgride a legislação sem pejo nem contestação, faz candidatos desistirem de concorrer a governos de Estados, determina quem vai disputar o Senado, transforma um político de dimensão nacional como Ciro Gomes em estafeta de suas conveniências, quer mandar na escolha do candidato a vice do PMDB e, no ápice da convicção de ser absoluto, vive a convicção de que pode comandar a vontade do eleitor que o seguiria independentemente da qualidade da candidatura por ele sustentada.
Em resumo, transita como um coronel em seu hábitat, o curral eleitoral.
Feito o longo enunciado da premissa, vamos ao ponto: só esse modo de agir de Lula já seria suficiente para marcar a especificidade do processo eleitoral brasileiro e a impossibilidade de compará-lo a qualquer outro na tentativa de estabelecer paralelos com resultados de eleições já concluídas.
Especificamente a do Chile, onde Sebastián Piñera derrotou o ex-presidente Eduardo Frei, candidato da presidente Michele Bachelet, dona de 81% de aprovação popular.
Como raciocínio hipotético à falta de uma discussão mais consistente, até vale o cotejo. Mas a conclusão de que é "prova" de que voto não se transfere e, portanto, Dilma teria necessariamente o destino de Frei é falha. E rasa.
Não leva em conta as diferenças abissais entre os dois países, seja no histórico, na formação educacional de suas populações, na definição ideológica dos partidos, na identificação entre eles na formação das coalizões, na natureza da popularidade de um e de outro presidente (aqui fruto de um bem montado esquema de culto à personalidade) e, principalmente, no papel dos chefes de ambas as nações no processo eleitoral.
Ao contrário de Lula, Bachelet não carregou um "poste". Uma por questão de estilo e circunstância, outra porque Eduardo Frei tem história no Chile.
Lá, a transferência de votos não foi questão decisiva como será aqui nem a presidente da República galvanizou as atenções tomando ela o lugar do candidato. Tampouco são semelhantes as razões do eleitorado para decidir.
Essas observações não pretendem montar uma equação a respeito de vantagens ou desvantagem comparativas, mas apenas pontuar uma obviedade: impossível comparar situações diferentes e pretender chegar a uma conclusão razoavelmente condizente com a realidade.
O que vai definir o desempenho de Dilma é o grau de empatia que ela conseguir, ou não, estabelecer com o eleitor.
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