O sonho de Lula
Em campanha para a ONU , o presidente aposta em imagem de líder pacificador de conflitos
Claudio Dantas SequeiraCANDIDATO
Para Ki-moon, seu opositor, Lula é só críticas; e ao “Times” ele faz juras de paz
A nove meses de deixar o Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva movimenta- se em duas frentes. No Brasil, a meta é eleger a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, sua sucessora. No Exterior, o candidato é ele mesmo. Lula acelerou, nos últimos meses, a estratégia para tornar-se secretário-geral das Nações Unidas, posto máximo na burocracia internacional, hoje ocupado pelo sul-coreano Ban Ki-moon. A tática dos assessores encarregados da campanha lá fora é associar a imagem de Lula à resolução de conflitos internacionais. Por isso, as viagens protocolares estão sendo substituídas por ações cirúrgicas em regiões de desastres e áreas de notório impasse político. É a chamada “agenda de crise”, na definição dos diplomatas. Mesmo sem assumir ostensivamente sua ambição, Lula age como candidato e não poupa caneladas à gestão de Ban Ki-moon, cujo mandato termina no ano que vem. Foi o que o presidente fez há duas semanas, quando desembarcou em Israel pregando o diálogo entre israelenses e palestinos. “A ONU é que poderia estabelecer o processo de paz. À medida que não cumpre esse papel, existe um vácuo”, disse Lula. Em fevereiro, ele já havia acusado a ONU de inação na questão da soberania argentina sobre as ilhas Malvinas.
Em maio, Lula pisará no Irã – outro campo minado – e já se prepara para desfiar seu rosário de críticas à passividade de Ban Ki-moon. Mas as investidas do presidente podem acabar tendo um efeito indesejado. “O secretário-geral deve ter o cuidado de se mostrar completamente neutro. O poder de veto dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança é uma arma muito importante. Um veto pode barrar uma candidatura”, alerta Riordan Roett, diretor de Estudos do Hemisfério Ocidental, da Johns Hopkins University. Até agora, Lula contaria com o apoio do presidente da França, Nicolas Sarkozy, anunciado durante a Cúpula do G20 no ano passado, em Pittsburgh. Mas o fato é que o mandato de Ban Ki- Moon está perto do fim e a campanha para sua substituição já chegou aos corredores da sede do organismo em Nova York. “As consultas informais já começaram, e não surpreende que o nome do presidente Lula tenha surgido”, disse à ISTOÉ a vice-presidente do International Crisis Group (ICC), Fabienne Hara, especialista em ONU. Segundo ela, Ban Ki-moon tem sofrido desgaste por seu desempenho na ONU e dificilmente terá o mandato renovado. No ano passado, vazou para a imprensa uma carta da embaixadora da Noruega na ONU acusando o secretário-geral de ser uma liderança “fraca, ineficaz e contraproducente”. “Os EUA, que apoiaram o nome de Ban Kimoon, também estão decepcionados com sua gestão”, afirma Fabienne, mas explica que Lula terá pedras no seu caminho para a ONU. A tradição determina a rotatividade do posto entre os continentes. A América do Sul já teve o peruano Javier Pérez de Cuéllar entre 1982 e 1991.
Depois foi a vez da África e agora da Ásia. “Caso Ban não seja reeleito, a Ásia provavelmente vai querer indicar outro representante. E depois será a vez da Europa”, afirma Riordan Roett. Fabienne ressalta também que Lula não fala nenhuma das línguas oficiais da ONU, como inglês e espanhol. Mas para o ex-metalúrgico nada é impossível. No início do ano passado, a Secretaria de Comunicação da Presidência contratou a CDN, uma das maiores agências de comunicação do País, para divulgar a imagem do governo Lula no exterior. Vice-presidente da CDN, o jornalista Inácio Muzzi afirma que o contrato, de R$ 15 milhões, com duração de um ano, já foi renovado por igual período. Em novembro, a empresa fixou escritório em Washington e, em pouco mais de um ano de atividades, atendeu a 3.200 pedidos de correspondentes estrangeiros, além de promover visitas de jornalistas de peso, como o colunista Thomas Friedman, do “The New York Times”. Há duas semanas, Lula foi tema de reportagem no jornal inglês “The Times”, que destacava exatamente sua campanha para substituir Ban Ki-moon como secretário-geral da ONU. Que ninguém se iluda: a campanha não é só para inglês ver.
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