ARTIGO
Alternativa difícil
A candidatura da senadora Marina Silva pelo Partido Verde tem uma característica, que ficou evidenciada na entrevista que concedeu ao “Jornal Nacional” na terça-feira: ela ainda não consegue passar a sensação de que teria condições de governabilidade, caso fosse eleita presidente da República. Esse foi o tema central da entrevista concedida pela candidata do Partido Verde ao “Jornal Nacional”. E, no “Jornal das Dez” da Globonews, a candidata teve a oportunidade de se aprofundar na sua explicação.
Para ganhar a eleição, ela teria que ser um tipo de candidata voluntarista, assim como o Collor de 1989, que era de um partido inexistente, o PRN, e foi arrebatando o eleitorado ao longo da campanha com um estilo agressivo de fazer oposição tanto ao governo da época quanto a Lula e Brizola.
Mas os tempos são outros e, sobretudo, o estilo de Marina é outro, diametralmente oposto.
Ela é conciliadora, se expressa muito bem, é muito doce nas colocações. Tem uma história de vida admirável.
Mas, numa eleição polarizada que reflete a situação política que estamos vivendo há 20 anos entre PT e PSDB, dificilmente uma candidata com esse perfil consegue furar a barreira e aparecer como uma alternativa viável.
Sua utopia parece atraente: governar com os melhores de PT, PSDB, PMDB e DEM, um governo de coalizão nacional.
Ela concede que mesmo no PMDB e no DEM há “pessoas de bem”.
Seria a República dos homens de bem.
Mas Marina não parece ser a liderança para viabilizar um governo dessa categoria. O que ela pode tirar de melhor dessa campanha, pelo menos até o momento, é tentar crescer a ponto de provocar um segundo turno na eleição presidencial, para então negociar compromissos de um dos dois finalistas em relação ao meio ambiente.
Essa deveria ser a meta factível do Partido Verde, ser o fiel da balança num segundo turno.
Ela tenta abrir esse caminho através do diálogo, da negociação, por questão de estilo, e também por cálculo político.
Depois de 30 anos de PT, Marina tem claramente dificuldades de romper com seu antigo partido.
Ontem mesmo, alegou que não criticaria os erros do PT porque não é “antiética”.
Se referia principalmente ao mensalão, outro tema levantado pelo “Jornal Nacional”, que ela alega ter combatido por dentro, optando por uma ação oposta a alguns companheiros, que saíram do partido para fundar o PSOL.
Mas há um cálculo político por trás dessa atitude de Marina que, assim como Serra, não quer brigar abertamente com o governo Lula.
Todos imaginam ir para o segundo turno e ter alguns votos dos lulistas que, eventualmente, estejam insatisfeitos com a candidatura de Dilma Rousseff e se disponham a escolher uma alternativa.
Especialmente Marina, que tem uma história no PT.
O presidente Lula comparou Dilma a Mandela numa tentativa, que soou ridícula, de transformar seu passado de guerrilheira contra a ditadura militar em um episódio de heroísmo.
O estilo de fazer política de Marina, desde os tempos dos seringais do Acre junto com Chico Mendes, é o da “resistência pacífica” de Gandhi.
Mas Marina não é Gandhi, não exala aquela força interior que transforma a fragilidade em poder de ação.
Pelo menos nunca tentou se comparar a Gandhi.
Na coluna de terça-feira, comentando a entrevista da candidata oficial, Dilma Rousseff, ao “Jornal Nacional”, critiquei o fato de ela ter anunciado investimentos de R$ 270 milhões em saneamento na Rocinha, afirmando que não existiam projetos de saneamento no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) daquela favela carioca.
Ontem, O GLOBO publicou uma reportagem em que afirma que os investimentos em saneamento na Rocinha foram de R$ 80 milhões e, portanto, tanto eu quanto a candidata petista estaríamos errados.
A aparente contradição entre meu comentário e a informação do GLOBO é explicada pela conceituação do que seja saneamento.
Em termos técnicos, existem dois tipos de “saneamento”: o básico — água e esgoto — e o ambiental — água, esgoto, drenagem e lixo.
Nenhum dos dois foi aplicado na comunidade da Rocinha, cujo PAC é um projeto urbanístico que consta da construção de um complexo esportivo; um hospital tipo UPA; um centro de convivência; uma creche; construção de moradias para 500 famílias e a abertura da Rua 4, visando à passagem de carros, ambulâncias, etc, como alternativa à Estrada da Gávea, única via que corta a Rocinha.
Haverá também um plano inclinado na área conhecida como Roupa Suja. E urbanização, com pracinha e plantio de árvores, na Via Ápia.
É claro que nestas áreas onde houve a construção de edifícios, apartamentos e vila esportiva foram abertas redes de água e esgoto.
Seria simplesmente impossível o Estado fazer essas obras sem esse tipo de saneamento “básico”.
Mas, se isso fosse considerado projeto de saneamento, qualquer edifício construído em qualquer lugar no Rio de Janeiro seria contabilizado como uma “obra de saneamento”.
Além do mais, as obras do PAC não afetam nem 3% do território da Rocinha, que continua tendo os problemas estruturais de sempre e seríssimos: esgoto a céu aberto, sem política nenhuma de gestão do lixo e a maioria das áreas sujeitas a inundação.
Quando chove na Rocinha, entra água em 90% das moradias.
A sujeira desce pelo canal que termina em São Conrado e chega tudo até o mar.
Projeto de saneamento do governo federal é o de Sepetiba, esse sim, mexe com a rede estrutural de uma área imensa, fazendo rede de água, esgoto, drenagem e lixo.
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