Lula triplica número de carreiras no Executivo
Política da atual administração é alvo de críticas no próprio governo
Além das categorias de elite do funcionalismo, as carreiras passaram a contemplar demandas de escalões mais baixos
Além das categorias de elite do funcionalismo, as carreiras passaram a contemplar demandas de escalões mais baixos
GUSTAVO PATU
DE BRASÍLIA
A administração Luiz Inácio Lula da Silva deixará uma herança na máquina pública mais duradoura, embora menos visível, que os aumentos do quadro de pessoal e dos salários do funcionalismo: sob pressão das corporações, foi triplicada nos últimos anos a quantidade de carreiras no Poder Executivo, o que gera críticas na área de gestão do próprio governo.
No passado só criadas para as categorias da elite do serviço público, como auditores-fiscais, diplomatas ou advogados da União, as carreiras passaram a contemplar as demandas de órgãos em particular e seus funcionários de escalões mais baixos. No caso mais radical, um único hospital, o das Forças Armadas, reúne hoje três carreiras exclusivas.
De 2002 para cá, saltou de 31 para 108 o número de carreiras civis listadas na Tabela de Remuneração dos Servidores Federais, publicada periodicamente pelo Ministério do Planejamento.
Os registros podem conter alguma imprecisão -a pasta, que não forneceu dados oficiais para 2002, informou contabilizar 129 carreiras atuais, sem detalhar os critérios. Qualquer que seja a taxa, porém, a proliferação é evidente.
Ela é acompanhada pela multiplicação dos diferentes tipos de cargos citados no índice da tabela federal de remuneração, nem todos vinculados a carreiras.
Eram 97 no início da administração petista; são 317 agora, descendo a detalhes como motorista do Ipea, auxiliar de serviços diversos do Seguro Social, professor do ensino básico federal dos ex-territórios e técnico de laboratório da Agricultura.
CARGOS
Uma carreira compreende um ou mais cargos com responsabilidades em comum.
A tradicional carreira de policial federal, por exemplo, conta com os cargos de delegado, perito, escrivão, agente e papiloscopista, cada um preenchido por concursos específicos e com planos de salários definidos. Mas nem sempre os papéis e a divisão das atribuições são claros.
Um caso emblemático é o de quatro carreiras diferentes voltadas para os mesmos três ministérios: a de previdência, a de seguridade social e trabalho, a de seguro social e a de previdência, saúde e trabalho -as duas últimas criadas por Lula, sem a extinção total das anteriores.
"Do ponto de vista técnico, a lógica da organização desta carreira é bastante inconsistente, só podendo ser compreendida a partir da lógica das pressões sindicais e política", afirmou, sobre a quarta, documento apresentado em 2008 por Aldino Graef e Maria da Penha Barbosa da Cruz Carmo, da Secretaria de Gestão, vinculada ao Planejamento.
Radicalizada recentemente, a multiplicação de carreiras, segundo os dois técnicos, começou na década passada, "sempre em função do atendimento às necessidades de diversas áreas específicas da administração pública, iniciativas apoiadas por forte pressão política e sindical setorial, muitas vezes sem levar em conta uma visão de conjunto da organização dos recursos humanos da administração pública federal".
"Esse processo tem gerado inconsistências importantes e conflitos de competências e atribuições que vêm se acentuando a cada nova carreira criada", apontou-se.
CONTRAMÃO
Além de instituir salários diversos para funções equivalentes, a política vai na contramão da diretriz definida pelo próprio governo de privilegiar as carreiras chamadas no jargão técnico de transversais ou horizontais -ou seja, as que podem ser aproveitadas por todo o conjunto dos órgãos federais, facilitando o remanejamento e a troca de experiências.
É o caso das carreiras de analista de infraestrutura, criada por Lula para os ministérios envolvidos nas obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), ou de desenvolvimento de políticas sociais, já aprovada pelo Congresso, mas ainda sem aprovados em concurso. Tais iniciativas, entretanto, ainda são minoritárias.
"Queremos a transversalidade na administração direta", diz Marcela Tapajós, diretora de Relações do Trabalho, da Secretaria de Recursos Humanos. Um exemplo, relata, é a negativa às pressões dos servidores do Ministério do Trabalho por uma carreira própria.
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