ARTIGO
Os cinco anéis mágicos (Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa)

Sempre gostei de mapas e de globos. Ainda sou capaz de passar horas estudando um mapa ou examinando e correndo com o dedo um globo, fazendo roteiros fantásticos de viagens que jamais farei.
Quando criança isso era um dos meus programas favoritos em dias de chuva. Custei a compreender essa história dos japoneses estarem do outro lado do mundo e tinha pena das criancinhas japonesas que podiam despencar lá de baixo.
Sim, porque o outro lado do mundo, para mim, só podia ser lá em baixo. Em cima é que não era, em cima estava o céu, que eu via muito bem e para onde iam as pessoas boas. Ainda mais que quando comecei a ler e a me interessar pelo mundo à minha volta, estávamos em guerra e o japonês, assim como o italiano e o alemão, era inimigo. Conclusão: se era mau, não podia estar no céu. Logo, estava lá em baixo e se furássemos a terra, daríamos de cara com um japonês.
Assim pensava eu aos 6, 7 anos. E assim pensa o presidente Lula hoje.
Antes que o mundo caia sobre mim, como naquele samba-canção, repito aqui as palavras de Sua Excelência ao encerrar seu discurso ufanista em Estocolmo, no Seminário Empresarial Brasil/União Européia, segundo o paciente e heróico jornalista Clovis Rossi, enviado especial da FSP a todos esses eventos. Rossi nos dá um breve resumo das palavras em tom exaltado e ufanista do presidente Lula que, depois de dizer pérolas tipo "Os japoneses são mais ricos, tem mais dinheiro mas não são melhores que nós", encerrou suas palavras lembrando o pré-sal e falando de sua preocupação sobre a possibilidade de "se perfurar muito, trazer um japonesinho na ponta".
Pois eu acho que ia ser o máximo. Porque o japonesinho com certeza já viria com uma bela torre de petróleo e uma linda maquete de plataforma, ambas miniaturizadas, para nosso Museu do Petróleo e, muito provavelmente, pilotando seu possante carrinho elétrico.
Mas isso é para daqui a muitos anos. Por ora, o assunto palpitante são os novos e caros anéis do Rio, na feliz expressão da revista “The Economist”. Que, assim como nossa Imprensa, nem menciona o evento mais próximo, a Copa do Mundo. Aliás, ando impressionada com isso. O país do futebol, o grande campeão nessa modalidade que sempre foi paixão nacional, não parece muito preocupado com a Copa de 2014. Parece até que a festa máxima do futebol virou uma coisa tipo escolha de Miss Universo, festa que também apaixonava o Brasil e que hoje só aparece nas páginas internas dos jornais. Custo a crer, mas...
O presidente Lula repete muito que nós gostamos de falar mal de nós mesmos. Sinto muito tirar sua ilusão, mas nessa modalidade nós perdemos feio para os ingleses e americanos cujo humor ferino é na maioria das vezes voltado para si mesmo.
Lula precisava tratar da azia e ler números antigos do “Mad’, alguns exemplares do “Private Eye”, ou da “New Yorker”, e ouvir as sensacionais canções de um professor de matemática formado em Harvard, que lecionou no MIT, Tom Lehrer, que compõe e canta, ao piano, canções onde critica a direita americana, hábitos da sua terra, tolices de seus governantes e a falta de cultura geral que era e é um dos traços mais tristes daquele país que, de resto, é tão bom que produz professores como Mr. Lehrer. E caras que recebem o Prêmio Nobel da Paz na maciota...
"Nós gostamos de falar mal de nós", diz muitas vezes o presidente Lula. Eles gostam de falar mal do Brasil, repetem como papagaios os que ao ler críticas ao Brasil ou ao Governo Lula, ficam ensandecidos e agridem sem nem saber bem porque estão agredindo ou a quem estão agredindo.
Agora então chegamos ao ápice da megalomania: temos todos de estar eufóricos com o fato do Rio ser sede dos Jogos Olímpicos de 2016. É nossa obrigação de brasileiros patriotas e corretos. Pois eu estaria muito feliz se o Rio JÁ fosse a cidade filmada por Fernando Meirelles. Também estaria animadíssima se o Rio tivesse os problemas que tinha Barcelona antes das Olimpíadas. Conheci aquela cidade em 1960. Foi a primeira cidade européia na qual pisei e por isso ela é inesquecível para mim. Foi a cidade onde comemorei meus 23 anos. Da minha mente ela nunca saiu.
Depois lá voltei 4 vezes, em anos diferentes, sendo que a última vez foi em 1992, depois dos Jogos. Claro que está diferente. Claro que os Jogos lhe trouxeram muitos benefícios. Mas, por favor, mais respeito: não vão querer me convencer que o catalão passou a ter autoestima elevada e a amar sua cidade só depois desses benditos jogos porque isso é uma fantasia. O que aconteceu é que a cidade, inteligentemente, aproveitou os jogos e o dinheiro que correu por lá para restaurar áreas degradadas, melhorar os transportes e fazer Barcelona voltar-se de novo para o mar.
Barcelona nunca teve, excetuando talvez os anos da Guerra Civil Espanhola, os problemas que nosso Rio tem. O dia de fúria de ontem, fúria popular absolutamente justificada, é um bom exemplo do que vai acontecer em 2014 e, pior ainda, em 2016, se nossas autoridades continuarem a viver naquela cidade de sonho que Fernando Meirelles filmou, esquecendo que do outro lado das montanhas e dos trilhos do trem, fica a cidade do Rio de Janeiro.

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