ARTIGO
Repressão, cidadania e ternura
Podemos dividir o desempenho do Ministério da Justiça na administração do governo Lula em duas fases: no primeiro mandato prevaleceu a orientação política de tratar a criminalidade sob a ótica da advocacia criminal.
Já no segundo período, ainda em vigor, as medidas de leniência com o crime ganharam o adorno especial da sociologia penal, com ingresso do enunciado da cidadania.
Ambos foram regidos pelo conceito comum de que era preciso atacar as causas sociais da violência para se conseguir a emancipação da sociedade e assim eliminar o delito.
Não é preciso dizer que redundaram em tremenda perda de tempo e deram oportunidade para que o crime organizado prosperasse a ponto de comprometer a própria democracia.
No lugar de proteger a sociedade o governo se moveu pela ideia fixa de que era preciso apenas zelar pelos criminosos.
A Pasta, no primeiro período, foi dirigida por um lado para proteger o governo dos escândalos criminosos e de outro para afrouxar as leis penais com o objetivo de desafogar o sistema penitenciário.
Quatro iniciativas consagraram essa fase: a eliminação do Exame Criminológico, a adoção do flexível Regime Disciplinar Diferenciado para bandidos de alta periculosidade e envolvidos com organizações criminosas, o Estatuto do Desarmamento e a instituição do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas (Sisnad), que ensejou na liberação tácita do consumo de substâncias entorpecentes.
Hoje colhemos os resultados devastadores de tamanha irresponsabilidade.
Já no segundo mandato, a violência ganhou um PAC particular com a adoção do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), que tinha por escopo ser “um marco inédito no enfretamento da criminalidade do País.”
Conforme foi anunciado à época, a finalidade do programa era “articular políticas de segurança com ações sociais. Priorizar a prevenção e buscar atingir as causas que levam à violência, sem abrir mão das estratégias de ordenamento social e segurança pública.”
Ou seja, era só ternura.
Perfeitamente! As tais articulações sociais foram tão profundas que as obras do PAC da Segurança nas favelas do Rio de Janeiro estão sendo executados em sintonia programática com os líderes do tráfico de drogas.
No acordo, o crime organizado dita o ritmo do empreendimento, autoriza ou desautoriza quem pode atuar nas intervenções estatais de cidadania e a polícia está terminantemente proibida de subir o morro.
Já ia me esquecendo da grande medida que buscava minimizar as causas da violência. Para prevenir o ingresso dos jovens no mercado do crime o Pronasci criou o Bolsa-Maconha.
Na verdade, durante todo o governo Lula a segurança pública foi negligenciada, pois houve o entendimento político de que ao deixar o problema nas mãos dos Estados o Palácio do Planalto se via aliviado de arcar com o desgaste produzido pela criminalidade violenta e ainda não teria de suportar o ônus de financiar o setor.
Ou seja, o governo conseguiu levar a sociedade na conversa e ficou bem na fotografia mesmo diante do quadro incoerente do agravamento da criminalidade conjugado com investimentos declinantes.
Como o governo entrou na fase do estertor, não há tempo nem espaço político para se encetar uma iniciativa de segurança pública.
A matéria vai ser levada para a campanha eleitoral de 2010, onde se deve fixar compromissos e metas para a reforma do setor. São Paulo tem dado o exemplo de que o caminho para a resposta estatal à criminalidade organizada e desorganizada passa pela reestruturação das polícias, tendo como objetivo principal a integração das corporações militares e das instituições civis.
O Brasil precisa entender que não há saída para a superação da crise de criminalidade violenta sem a recuperação da agenda conservadora, o que implica na capacitação do poder repressor do Estado.
O brasileiro precisa de uma polícia unificada, do contrário não haverá convergência de finalidade na defesa do interesse público da segurança.
A instituição deve se guiar por métodos de inteligência para que possa se antecipar à atividade criminosa e assim cumprir a missão de prevenir o delito.
As ações de investigação devem ser apoiadas em critérios científicos para que haja funcionalidade do Inquérito Policial.
Por fim, é imprescindível fortalecer de fato a função de Corregedoria, sem a qual não haverá a assepsia dos corruptos que fazem da Polícia um instrumento do crime.
Feito isso podemos falar em cidadania e até imprimir um pouco de ternura.
Fonte: blog do Noblat
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