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terça-feira, 2 de março de 2010

Quem criou o bolsa-família?

02/03/2010

PSDB aprova verba extra ao Bolsa Família; PT critica

Fernando Donasci/Folha

Impregnada de maldade, a política desafia o mito da bondade brasileira. A cada quatro anos, porém, a eleição arranca a delicadeza de seu sono hibernal.

Às vésperas de um novo encontro com as urnas, todo político é um bom. Na sucessão de Lula, PT e PSDB travam uma gincana de delicadeza.

O símbolo da disputa é o Bolsa Família. O petismo diz que o programa é dele. O tucanato retruca: fomos nós que criamos.

Incomodado com a insinuação de que, devolvido ao Planalto, extinguiria a alegria da bugrada, o PSDB teve, no Senado, um surto de bondade.

Aprovou na Comissão de Educação um benefício extra para o Bolsa Família. Projeto do grão-tucano Tasso Jereissati (CE).

Consiste no seguinte: crianças que obtiverem boas notas na escola beliscam para suas famílias um benefício mensal extra.

O nível das notas e o valor do adicional não constam do projeto. Pela proposta, caberia ao governo definir as coisas.

Atropelado pela afabilidade do rival, o petismo subiu no caixote: Isso "é uma disputa político-partidária”, disse Ideli Salvatti (PT-SC), líder de Lula no Congresso.

Para Ideli, fazer política “em cima de crianças é inadmissível”. Acha que “os tucanos perderam o rumo”.

Alega que um dos objetivos do Bolsa Família é o de reduzir o trabalho infantil, retirando dos ombros das crianças a responsabilidade de levar dinheiro para casa.

Afirma que, com a fórmula Tasso, reacomoda sobre a criança o peso da obrigação de de ajudar a encher a geladeira.

“A criança que não tiver bom rendimento não vai sofrer pressão da família?”, questiona Idelli, “Volta a responsabilidade da criança de trazer dinheiro para casa".

Tasso rebateu: "Eles [os petistas] é que têm todo o viés político nas suas ações. Não tem nada que façam que não tenha coisa eleitoral por trás".

Velho defensor da causa educacional, Cristovam Buarque (DF), do governista PDT, associou-se ao tucanato:

"Discriminação é achar que filho de pobre não tem que ter bom desempenho escolar", disse Cristovam.

Reza o regimento do Senado que as comissões têm poderes terminativos. Significa dizer que, a menos que haja um recurso, o projeto vai direto à Câmara.

Sem medo de parecer malvada, Ideli anunciou: "Isso não vai passar sem debate no plenário [do Senado]...”

“...Vamos apresentar recurso para votá-lo no Senado. Só precisamos de nove assinaturas de senadores para levar o texto ao plenário".

Seja como for, a pantomima já produziu os seus efeitos. Vai ser divertido ver o petismo agarrado em lanças para impedir o reforço do Bolsa Família.

Tasso não desperdiçou a cena. Extraiu dela proveito máximo. Deixou no ar a pergunta: "Como o PSDB queria acabar se foi ele quem criou [o Bolsa Família]?"

Como se vê, são cruéis os caminhos da bondade. Na sua maldade excepcional, o político bom é capaz de invadir a escola para disputar votos agarrado ao pescoço das criancinhas.

Escrito por Josias de Souza às 19h22

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