Puro-sangue tucano e hemorragia no DEM
Por Cristian Klein JB

A desidratação eleitoral do Democratas é um dos fenômenos mais notáveis do sistema partidário brasileiro, de resto bastante estável. Há pouca variação na votação que as legendas recebem de uma legislatura para outra. Essa baixa volatilidade, por sinal, é um dos indicadores que mostram que, apesar do senso comum, os partidos no Brasil são capazes de estruturar, de um jeito ou de outro, as preferências dos eleitores, para além das candidaturas individuais dos políticos. A redução parlamentar do DEM é o que mais destoa neste quadro de estabilidade. Sua bancada – que era a maior na Câmara dos Deputados após a eleição de 1998 – hoje é a quarta.
O escândalo que envolve o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, abala a imagem da sigla e pode acelerar o processo. Mas não será determinante para sua crônica perda de apoio eleitoral. De todo modo, os efeitos imediatos do caso, se não evitados, poderão fazer uma grande diferença.
E isso, em boa parte, está nas mãos do PSDB. A derrocada de Arruda, que vinha sendo cogitado como um possível candidato a vice-presidente na chapa tucana, põe em risco o próprio status do DEM como parceiro predileto. Abre a possibilidade de novas alianças com outros partidos. Ou mesmo da formação de uma chapa que seria uma solução de compromisso para a tinhosa disputa entre os governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG) pela indicação do PSDB. No pior cenário, a chapa puro-sangue dos tucanos pode significar para o DEM a diferença entre um sangramento, que já vem ocorrendo, e uma hemorrágica perda de votos em 2010. Esta chapa, que já era cogitada, tornou-se mais provável depois do estouro do mensalão do DEM.
A pergunta é: por que não? Afinal, o que os tucanos ganhariam em renovar a aliança eleitoral com o Democratas? Nos anos 90, o apoio do antigo PFL foi essencial para o PSDB, na eleição de Fernando Henrique Cardoso. Era a união entre um partido forte nos grandes centros urbanos e uma sigla enraizada nos municípios pequenos, rurais, nos grotões. O domínio territorial do DEM, porém, já não é mais o mesmo. Programas federais do atual governo, como o Bolsa Família, quebraram antigas lealdades entre os eleitores e os tradicionais chefes políticos locais.
Num plano mais ideológico, também é duvidoso o ganho dos tucanos. No caso do PT, a aliança com a direita – sacramentada com a vaga de vice-presidente para o empresário José Alencar, do PR (ex-PL) – foi um divisor de águas. Permitiu-lhe ampliar o apoio para além dos 30% de votação que o partido não conseguia ultrapassar. A coligação entre o PSDB e o DEM, neste sentido, é mais coerente, porém mais redundante estrategicamente. As administrações tucanas já são identificadas com uma agenda cara ao eleitor mais conservador: a visão de um Estado minimamente interventor, a privatização e atributos como gestão técnica e eficiente. O voto mais à direita do DEM penderia naturalmente para a candidatura do PSDB. Aos tucanos interessaria mais a abertura de alianças ao centro e à esquerda, espaços ocupados pelo PMDB e pelo PT.
Já ficou mais do que claro que hoje é o PSDB quem deve se espelhar na trajetória petista e fazer o movimento – só que ao contrário – para sair da posição minoritária em que se encontra. A insistir nas atuais alianças e na clivagem ideológica, encontrará um teto eleitoral. A maioria da população já se mostrou favorável à agenda social do governo Lula. Agora, são os tucanos que precisam redigir sua “Carta ao povo brasileiro”. Não para se comprometer com o respeito aos contratos, mas para garantir a permanência dos programas sociais, vistos como uma conquista do país, assim como foi a estabilidade econômica.
O DEM, obviamente, é um partido maior que o PSB ou o PDT nas primeiras chapas presidenciais encabeçadas pelo PT. Tem um tempo de TV precioso, mas não dispõe de outra opção senão reunir forças com as hostes do aliado tucano. Hoje, tão fragilizado, o partido faria tudo, inclusive abdicar, arriscadamente, da vaga de vice. O mais importante é a vitória da oposição, como disse nesta semana o senador José Agripino Maia (RN). Logo ele, apontado como um dos vice-presidenciáveis do DEM. É o gesto de desespero para voltar ao governo e estancar a sangria desatada.
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