O Brasil está em baixa na bolsa de prestígio político de Washington. O entusiasmo demonstrado em abril pelo presidente Barack Obama – “esse é o cara”, disse ele sobre o colega brasileiro, em Londres – parece haver murchado. Depois de vários atritos, é incerta a visita do presidente americano a Brasília em 2010. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenta mostrar indiferença. Se Obama não vier, comentou, quem perderá será ele, porque deixará de ver como “o Brasil é importante, desenvolvido e tem muita coisa para mostrar”. Mas não deixou de exibir certa condescendência: “Continuo com uma grande expectativa em relação ao governo Obama. Ele ainda vai ser uma surpresa”, disse Lula ontem.
Com essas palavras, ele reiterou, de forma indireta e mais suave, o comentário recente de seu assessor para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia. Segundo o assessor, a política de Obama tem sido uma decepção. O chanceler Celso Amorim tentou na ocasião diminuir o estrago causado por seu colega de governo. Mas não teve êxito. As divergências em torno da eleição em Honduras e o apoio brasileiro ao presidente iraniano foram muito além das diferenças normais entre governos.
O mal-estar contaminou a imprensa e chegou ao Congresso, onde o senador democrata Frank Lautenberg suspendeu a votação de medida benéfica a exportadores brasileiros. As isenções do Sistema Geral de Preferências perderão vigor no dia 31. A votação interrompida pelo senador poderia estendê-las por um ano. Segundo a assessoria de Lautenberg, a ação do senador foi uma resposta à decisão do STF contra a devolução imediata do menino Sean Goldman ao pai, o americano David Goldman.
O apoio de Lula ao presidente iraniano foi desastroso perante a imprensa americana. Pressionado internamente e criticado na maior parte do mundo por seu programa nuclear, Ahmadinejad, segundo editorial do Washington Post, procurou amigos no exterior e só encontrou, de início, os governos africanos de Gâmbia e do Senegal e os latino-americanos da Venezuela e de “dois de seus satélites, a Bolívia e a Nicarágua”. Lula juntou-se a esse grupo quando os líderes da China e da Rússia condenavam a política iraniana. Assim, deu razão às democracias ocidentais para negar ao Brasil um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, acrescentou o jornal.
Lula também foi criticado pela imprensa americana e por analistas qualificados por se meter na política centro-americana sem saber o bastante sobre a região. Sua intervenção em Honduras foi vista como um obstáculo à solução da crise – erro agravado com a insistência em não reconhecer a legitimidade das eleições.
Para Moisés Naim, editor da revista Foreign Policy, “o Brasil se comporta como um país em desenvolvimento imaturo e ressentido”. Diplomatas do Departamento de Estado têm reagido às ações do governo brasileiro com perplexidade, mas em outras áreas do governo a reação é de mal disfarçada hostilidade, segundo relatou em artigo publicado no Estado de domingo o jornalista Paulo Sotero, ex-correspondente do jornal em Washington e hoje diretor do Brazil Institute do Woodrow Wilson International Center for Scholars.
A nova política externa brasileira é conduzida às vezes “com a petulância de novos ricos”, segundo experiente diplomata estrangeiro citado em artigo pelo ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos Rubens Ricupero. Nesse texto, publicado na Folha de S.Paulo, Ricupero contrastou o protagonismo do presidente Lula com a discrição do primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao. “Queremos ser mediadores no Oriente Médio e em Honduras, onde nossa influência é quase zero, enquanto a Unasul, que fundamos, completa um ano sem conseguir eleger o secretário-geral”, escreveu.
Em pouco tempo Lula envenenou, sem nenhum ganho econômico ou político para o País, o ambiente de boa vontade existente durante o governo republicano e mantido no começo da gestão de Barack Obama. Para ter influência global, comentou o Washington Post, o Brasil teria de abandonar o terceiro-mundismo de sua política externa. Não é provável que isso aconteça com o Itamaraty sob o domínio ideológico dos atuais formuladores da política externa.
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