PF esquiva-se de investigar o PT e o comitê de Dilma
O resultado parcial do inquérito do Fiscogate revela que a Polícia Federal é capaz de tudo, menos de investigar o PT e o comitê de campanha de Dilma Rousseff. Mais grave: o governo e o PT montaram uma operação para afastar a encrenca da quebra do sigilo fiscal de tucanos da campanha da pupila de Lula.
Nesta quarta (20), Brasília amanheceu sob o impacto da manchete daFolha: “PF liga quebra de sigilo fiscal de tucano à pré-campanha de Dilma”. Ainda pela manhã, numa entrevista improvisada, no Planalto, o próprio Lula aconselhou os repórteres a aguardarem pelos esclarecimentos da PF.
Segundo o presidente, a PF mostraria os fatos “como eles são, não como as pessoas gostariam que eles fossem”. À tarde, seguindo instruções do Ministério da Justiça, o diretor-geral da PF, Luiz Fernando Corrêa (na foto lá do alto) foi aos holofotes, como previra Lula.
"Não foi comprovada utilização [dos dados fiscais] em campanha política", disse Corrêa. A frase serviu de senha para uma outra entrevista. Presidente do PT e coordenador da campanha de Dilma, José Eduardo Dutra chamou de “bicho” o dossiê recheado com os dados ilegais.
Evocando as “conclusões” da PF, Dutra disse que “caiu por terra qualquer tentativa de dar o formato de estrela a esse bicho”. Acrescentou: “Na verdade, o bicho tem perna, pena e bico de tucano”. Acomodou o dossiê no colo do ex-governador mineiro e senador eleito Aécio Neves.
Com suas declarações, Lula, Corrêa e Dutra entraram em litígio com o óbvio. Vão abaixo os fatos que o Planalto, a PF e o PT se abstêm, convenientemente, de enxergar:
1. Abril de 2010: A serviço do comitê de pré-campanha de Dilma Rousseff, os ‘jornalistas’ Luiz Lanzetta e Amaury Ribeiro Jr. reuniram-se num restaurante de Brasília com o delegado aposentado da PF Onézimo de Sousa e arapongas da comunidade de informações.
2. Maio de 2010: A revista Veja revelou a reunião do restaurante e o teor da conversa. Lanzetta e Amaury tentavam montar operação para espionar José Serra. Em entrevista, Onézimo confirmou a encomenda. Disse tê-la recusado. Contou que Lanzetta falava em nome de Fernando Pimentel (PT-MG), à época um dos coordenadores da campanha de Dilma.
Depois, em depoimento no Senado, Onézimo reafirmou o que dissera. Acrescentou um detalhe: na reunião, Amaury informara que dispunha de “dois tiros fatais” contra José Serra.
3. Junho de 2010: A Folha noticiou que um dossiê com dados fiscais do dirigente tucano Eduardo Jorge circulou no “grupo de inteligência” do comitê de Dilma, integrado por Lazetta e Amaury. A revelação resultou na abertura do inquérito da PF.
Abriu-se também uma sindicância na Receita Federal. Já no alvorecer da apuração, dirigentes do fisco apressaram-se em dizer que não havia “conotação eleitoral" nos vazamentos. Tudo não passava de um “balcão de negócios”, movido a “propinas”.
4. Setembro de 2010: Reportagem de Veja informou que o “grupo de inteligência” do comitê de Dilma, desativado depois de virar manchete em maio, manuseara um papelório chamado “Operação Caribe”. Coisa de 40 páginas. Redigiu-as Amaury Ribeiro.
O documento continha os dados fiscais de familiares, amigos e partidários tucanos de José Serra. O rol incluía a filha do candidato, Verônica Serra. Ouvido, Amaury admitiu a autoria do “trabalho”. Alegou tratar-se de apuração “jornalística”, feita à época em que era repórter do diário “Estado de Minas”.
Na versão de Amaury, petistas invadiram o flat em que ocupava em Brasília, roubaram as informações de seu computador e converteram-nas em dossiê. Curiosamente, o petismo pagava a hospedagem do repórter. E Amaury não deu parte do “roubo” à polícia. Faltou-lhe nexo.
5. Outubro de 2010: O tempo passou. Sobreveio o segundo turno. E nada das conclusões da PF. O governo programara-se para prestar esclarecimentos apenas depois da apuração final das urnas. Súbito, os resultados parciais do inquérito escalaram a manchete da Folha desta quarta (20).
O repórter Leonardo Souza revelou que um despachante de São Paulo admitiu à PF ter recebido de Amaury Ribeiro a encomenda da quebra de sigilo fiscal de oito parentes, amigos e companheiros de partido de José Serra. Amealhou R$ 12 mil.
Veio à luz também depoimento do próprio Amaury à PF. Reconheceu ter contactado o despachante. Coisa de setembro de 2009, época em que trabalhava no diário mineiro. Alegou que mirara em José Serra para “proteger” Aécio Neves. Por quê?
Descobrira que, a serviço de Serra, que disputava a vaga de presidenciável com Aécio, o deputado tucano e ex-delegado Marcelo Itagiba (RJ) perscrutava a vida do ex-governador mineiro. Não esclareceu se conversou com Aécio, que, em nota, negou enfaticamente vinculação com o malfeito.
Ao dizer que “não foi comprovada utilização [dos dados] em campanha política”, o diretor-geral da PF apaga da investigação todo o ano de 2010. Ao declarar que o “bicho” é tucano, o presidente do PT acomoda um manto diáfano sobre a ação do “grupo de inteligência” que o comitê de Dilma teve de desmontar às pressas.
A dupla deixa boiando na atmosfera uma série de interrogações. Por exemplo: Por que a PF não intimou para depôr o ‘jornalista’ Lanzetta, o ex-coordenador Fernando Pimentel e o delegado aposentado Onézimo? Ainda que se admitisse, para efeito de raciocínio, a origem tucana das violações, quem converteu os dados ilegais em dossiê foi o comitê petista de Dilma, não o tucano Aécio Neves.
Num procedimento inusitado, o PT levou ao seu portal na web as explicações do delegado Alessandro Moretti. Escalado para falar aos jornalistas ao lado do diretor-geral Corrêa, ele discorreu sobre a investigação. Parou em 2009. Nada sobre a fase em que o “bicho” ganhou a vistosa forma de “estrela” (assista abaixo).
Josias de Sousa
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