Balanço do governo Lula exalta queda dos juros e omite escândalos
Maurício SavareseDo UOL Notícias
Em São Paulo
Em um balanço de governo composto por seis livros, divulgado nesta quarta-feira (15), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva elogia a redução de taxa Selic – apesar de o país ainda ter os juros reais mais altos do mundo – e enumera ações anticorrupção desde 2003, sem citar ligação de nenhuma medida com escândalos que abalaram o Palácio do Planalto nos últimos anos. O registro do documento em cartório foi feito por ele ao lado da presidente eleita, Dilma Rousseff, do presidente do Senado, José Sarney, e da primeira-dama, Marisa Letícia.
Durante a cerimônia, à qual compareceram atuais ocupantes da Esplanada dos Ministérios e também ex-ministros poderosos, como a senadora Marina Silva (PV-AC) e José Dirceu, Lula repetiu críticas à imprensa, a quem acusou de se interessar mais por notícias desfavoráveis a seu governo. Ele pediu "aos 4% que teimam em dizer que nós somos ruim e péssimo [nas pesquisas]" que "olhem para a Dilminha com os olhos diferentes". O presidente também creditou os resultados da gestão ao vice, José Alencar, internado em São Paulo.
"Em meu discurso de posse, fiz questão de afirmar que me tornava o servidor público número um do Brasil. Hoje o presidente e os ministros estamos fazendo a obrigação de todo servidor público: prestar contas", afirmou ele, que aproveitou seu bordão para dizer que era a primeira vez em que a iniciativa era feita no Palácio do Planalto. "Tem gente que fica incomodada. Mas estamos apenas fazendo o que os outros não fizeram", alfinetou Lula, em um dos raros momentos de improviso durante sua fala.
Elaborados pela Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência da República) e assinados por todos os ministros, os dados que constam em seis livros vinham sendo compilados e registrados em cartório desde meados de 2008, após um pedido de Lula para fornecer informações sólidas a quem viesse a sucedê-lo. Há dois livros que tratam de desenvolvimento sustentável, dois de cidadania e inclusão, um de infraestrutura e outro de política externa, gestão e democracia. O conteúdo está disponível neste link .
Economia
No documento, o governo reconhece que o nível dos juros reais no Brasil é “elevado em termos mundiais”. “Mas representa substancial redução em relação ao verificado no início de 2003, que foi de 16% ao ano”, diz o texto, que começa lembrando que o governo Fernando Henrique Cardoso deixou a Selic em 25% e que, por conta das turbulências econômicas de início de governo, Lula a elevou a 26,5% pouco depois. Em seu discurso, o presidente não se ateve à questão dos juros.
Hoje a taxa de juros básica está em 10,75%, após anos de críticas de membros do próprio governo ao conservadorismo do Banco Central na gestão do presidente Henrique Meirelles, que será sucedido por Alexandre Tombini no governo da presidente eleita Dilma Rousseff. Antes de chegar ao Palácio do Planalto, Lula afirmava que o país deixaria de ter os juros reais mais altos do mundo.
Quando ele assumiu, a taxa real – com o desconto da inflação projetada para 12 meses – estava em 11% ao ano. Hoje esse número é de 4,8%, mas há países, muitos deles abatidos pela crise econômica, onde o indicador é negativo, porque o juro é menor do que a expectativa de inflação. Quando Meirelles passou por ele para assinar o documento, Lula abraçou longamente o presidente do BC, que, por sua vez, ganhou bastante atenção da próxima ocupante do Palácio do Planalto ao cumprimentá-la.
Mais tarde, sem fazer referência a Meirelles, Lula afirmou que Dilma é a única responsável pelas indicações em seu governo. Assessores do presidente dizem que ele defendia a permanência do presidente do BC. "Espero que os companheiros da imprensa não digam que estou querendo ensinar você a fazer alguma coisa", disse. Sobre alguns dos indicados, Lula afirmou que eles são "muito mais amigos da Dilma" do que dele, já que ela era a ministra que coordenava o governo até março deste ano. "Ela escolhe quem ela conhece", afirmou.
Corrupção
No capítulo que trata de combate à corrupção, o balanço do governo cita a abertura da CGU (Controladoria Geral da União), que visa dar transparência a gastos públicos. Também menciona o reaparelhamento da Polícia Federal e medidas contra a lavagem de dinheiro. Mas evita ligar qualquer medida aos escândalos que abalaram o governo de Lula desde 2003. Durante a cerimônia no Palácio do Planalto, apenas o ex-ministro e atual governador da Bahia, Jaques Wagner, mencionou "qualquer erro que possa ter sido cometido" em 2005.
Lula não fez referência ao escândalo do mensalão, denunciado no ano citado por Wagner, mas falou em "qualquer erro" que possa ter sido cometido pelo governo entre 2003 e 2010. Políticos que pediram demissão por envolvimento em denúncias de corrupção, como Dirceu, ex-ministro-chefe da Casa Civil, e Matilde Ribeiro, ex-secretária da Igualdade Racial, estavam presentes.
O balanço foi ainda menos crítico. “Há muito a sociedade brasileira vinha exigindo uma nova ética nos governos, uma nova forma de administrar, com mais responsabilidade, mais transparência e voltada à concretização dos direitos e das garantias fundamentais”, diz o texto, que comemora a CGU, uma vez que “não havia um órgão governamental devidamente estruturado com a missão de desenvolver e implementar estratégias de combate à corrupção”.
Durante o governo Lula, escândalos políticos levaram à adoção de medidas administrativas. Quando funcionários públicos, inclusive ministros, fizeram mau uso de cartões corporativos, o Palácio do Planalto foi forçado a estipular novas regras de uso. Depois do vazamento dos sigilos fiscais de tucanos, a Receita Federal alterou as políticas de acesso de funcionários ao banco de dados. No balanço, não há citação a nenhum desses incidentes e o destaque são os elogios ao site que divulga dados do Poder Executivo.
“As despesas públicas não eram acessíveis facilmente ao público, assim como não havia canais diretos de comunicação para a sociedade informar e solicitar a apuração de irregularidades”, afirma o documento, citando o Portal da Transparência. Ainda assim, o Brasil ainda obteve no governo Lula uma lei de acesso a informações públicas.
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